Thursday, September 07, 2006

Um pouco de Filosofia para ser feliz...

Há vidas que dariam uma verdadeira novela. Novelão mesmo, daquelas no melhor estilo Manoel Carlos. A de Bertrand Russell, por exemplo, é uma dessas. Primeiro: o homem viveu pra cacete! Matusalém perde... Nasceu quando a Rainha Vitória ainda dava as cartas na Inglaterra e morreu depois que o homem já havia pisado na lua. Segundo: Russell era o cara! Literalmente... Não contente em ser apenas o conde de Russell, o sujeito também enveredou pela Matemática, Filosofia, Política e ainda abocanhou um prêmio Nobel em 1950. Mas não é sua extensa e movimentada biografia o assunto desse meu primeiro post. Na realidade, Bertrand Russell me veio à cabeça, depois de desligar o telefone ontem à noite. Lá estava eu, com um grande amigo, fazendo meu ouvido de CVV, discorrendo sobre sua vidinha monótona e repetindo a cada dez minutos o quanto andava infeliz e deprimido. Eu me esforçava pra entender, mas não conseguia. Fico sinceramente chocado quando alguém admite ser infeliz. Jesus Crucificado de Porto das Caixas, ter uma caminha quente, um pratinho de comida no almoço e uma casinha pra se voltar no fim do dia não é suficiente? Parece que não, porque pra fechar a cantilena, ele ainda me saiu com essa: "Eu me sinto triste até quando estou feliz!"
A verdade é que meu amigo não é o único. Prova disso são as prateleiras das livrarias do planeta inteiro, abarrotadas de títulos e mais títulos ensinando "aonde encontrar a tal da Dona Felicidade". Eis aí, caríssimos, mais um mérito de Russell. Muito antes de tudo isso, o sujeito já tinha escrito um livro chamado "A Conquista da Felicidade". Logo de cara, ele avisa que não pretende tecer considerações eruditas sobre o tema e é verdade. Era a Filosofia descendo a cátedra e encontrando a massa.
O primeiro ponto abordado por Russell diz respeito ao prazer. Para ele, felicidade e prazer caminham lado a lado. E o prazer provém da superação de um obstáculo. Maria queria ser médica, mas antes disso deveria passar pela peneira do vestibular, depois encarar seis ou sete anos na Universidade, mais noites mal dormidas, pouco tempo para si e para os amigos, etc., etc. No problem. Na grande noite em que Maria recebesse o canudo e colasse grau, tudo isso não faria diferença. Ou faria. Apesar de todos os obstáculos e contratempos, Maria chegou lá. E tudo isso contribuiria para dar à sua conquista um saborzinho especial. Vim, vi e venci. É verdade que o buraco é muito mais embaixo e que a história pode seguir por outros caminhos. Tem gente que tem uma estrela filha da mãe! Tipo o Carlos, um velho conhecido do tempo do colégio. O carinha pintava horrores! Jamais havia feito qualquer tipo de curso. Dizia que não era nada demais, que havia gente bem melhor que ele. Onde pobre podia pensar em ser artista? Pobre tinha era que ganhar o pão do dia-a-dia! Acontece que um dia, por um desses acasos do destino, um dos trabalhos de Carlos caiu nas mãos de um professor da Escola de Belas Artes. Pronto. Foi o começo de uma longa história. Carlos hoje é famoso e uma tela sua custa uma pequena fortuna. Ainda não acredita que a vida lhe tenha sido tão generosa. Logo ele, que jamais teve grandes ambições. Aqui, não é o prazer que causa a felicidade, mas sim a surpresa. O contrário também poderia acontecer, evidente: Carlos podia se achar o bam-bam-bam, ter feito todos os cursos de artes possíveis e imagináveis e mesmo assim, simplesmente não acontecer. E ao invés de feliz, Carlos seria um decepcionado.
Quando Russell punha no papel todo esse blá-blá-blá, um tal de Existencialismo era a vedete da vez, com um papo de que a vida é repleta de absurdos, que você tem o livre-arbítrio para decidir o que deve ou não ser feito, mas que, freqüentemente, qualquer que seja sua escolha, ela é uma escolha ruim. Russell odiava esse lero-lero. Para ele, as pessoas desejam ser amadas e não toleradas. Acontece que pedir amor é pedir muito mais do que a vida possa dar. É onde surge a melancolia e - ela não é boa. O único caminho de se ver livre dela é tendo gosto em viver. Felicidade é exatamente gosto pela vida. E gosto de viver é se interessar pelo que a vida nos oferece. Resumindo: por quando mais coisas eu me interessar, maiores serão minhas oportunidades de felicidade. Quando meus interesses são muito restritos – azar o meu – maiores serão minhas chances de decepção. O caminho da felicidade é ter gosto em viver e se surpreender com o mundo. Robério já tinha tudo programadinho em sua cabeça. Aos 25 se formaria em Direito, aos trinta no máximo já teria ingressado na Magistratura, casado com Carla morando num confortável apartamento no Leblon. Já estava com quase 35 e necas. Tentava, tentava, tentava, mas nada de ser juiz. Leblon então! Continuava no Andaraí...
Continuar batendo na mesma tecla pode ser duas coisas: ou fuga ou esquecimento de outros aspectos da vida. A fuga, por sua vez, pode escambar para o exagero e o exagero se traduz de duas formas: ou uma atividade intelectual intensa ou ela - olha a melancolia novamente aí, gente! O remédio: a boa e velha moderação. É preciso ter pé no chão e saber a hora de encarar a vida real...
Para que se tenha novamente gosto em viver é essencial que o homem se sinta amado – e que ame! Amor sem interesse, sem vantagem, amor que não almeje segurança ou proteção. Amor desinteressado. Como na família. Eu posso amar crianças, mas jamais amarei qualquer delas na mesma proporção que amo meu filho! Essa é a receita. Quem ama cuida. Amar é saber que existe alguém que é por você nesse mundo. É isso que falta ao ser humano. Definitivamente, essa não foi uma conclusão exclusiva de Russell. Desde a Antigüidade, a amizade é considerada como a própria expressão da felicidade. O velho Aristóteles repetiu isso até a exaustão. E estava certo.
A verdade é que, surpreendentemente, a felicidade pode estar mais perto do que imaginamos... É a velha história do pássaro azul. A gente roda, bate cabeça, funde a cuca e ele estava ali, todo o tempo, ao nosso lado. Pode até parecer papo de alienado, mas somos nós quem complicamos a vida. Bom humor e leveza de atitude são fundamentais! E é lógico e evidente que se possa ser feliz, sim! Ser feliz ganhando não tão bem assim, ser feliz não tendo o corpo perfeito, ser feliz tendo dívidas para pagar, ser feliz sem namorada, ser feliz morando em São Gonçalo, ser feliz andando de ônibus, ser feliz apesar de todos os problemas... Essa receita não deve ser encarada como uma atitude de fuga ou algo que nos leva a abrir mão dos nossos sonhos. É importante ter-se metas na vida! E realiza-las nos torna felizes. Porém, mais importante ainda é saber que existem outras possibilidades de felicidade...
Gostaria que meu amigo lesse essas mal traçadas linhas, mas creio não ter embasamento para isso, afinal quem sou eu, né? Além do que, conselho se fosse bom não se dava, mas vendia! Mas quem sabe, janeiro chegando, não posso investir meus parcos reais num presente de aniversário mais caprichado? E que o próprio Russell fale por mim...

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